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PROBLEMA, HIPÓTESES E VARIÁVEIS

PROBLEMA, HIPÓTESES E VARIÁVEIS


Neste tópico será abordado as primeiras fases do processo de investigação, nomeadamente a formulação do problema, a elaboração da(s) hipótese(s) e a definição da(s) variável(eis), partindo quer de estudos de caráter experimental, quer de caráter correlacional e descritiva.

Definição de um problema
Uma investigação inicia-se sempre pela definição de um problema, logo o que importa é identificar e defini-lo, construir um modelo que nos permita uma aproximação ao seu estudo e testar o modelo entretanto construído. Esta sequencia é importante e decisiva no processo científico de construção de conhecimento. Qualquer investigação é conduzida tendo em vista esclarecer uma dúvida, replicar um fenômeno, testar uma teoria ou buscar soluções para um dado problema. A definição do problema constitui a primeira fase na elaboração de um projeto, enquanto prévia à construção de um modelo pretensamente explicativo, a definição do problema é uma fase essencial e nela se inclui a definição das hipóteses e a operacionalização das variáveis a considerar, enquanto a testagem do modelo implica a observação/experimentação e o tratamento dos dados.

            
      Quadro I - Fases na definição de um problema e de um modelo de análise

Passos na definição de um problema
Inicia-se a investigação quando se procura a resposta a uma pergunta, dificuldade ou problema, sendo em Psicologia e educação, a formulação do problema na forma de questão (compreensão ou explicação de um fenômeno) ou como resposta (decisão sobre as propriedades de um tratamento ou metodologia).
Vários passos podem ser dados no sentido da definição do problema da investigação, o primeiro: identifica-lo, descrevê-lo e relaciona-lo. Já o segundo passo, traduz a importância de se avaliar a qualidade e a pertinência do problema identificado, ponderando a sua relevância. Alguns parâmetros devem ser considerados na apreciação:

A definição de um problema pode ser realizada através de um raciocínio indutivo ou dedutivo, sendo o primeiro caso demonstrado quando vários fenômenos singulares são observados e, a partir deles, procura-se chegar a algo que os unifica. No dedutivo, o ponto de partida não são as observações singulares, mas as teorias já existentes. Sendo ambos necessários e presentes na Psicologia e na Educação.

            Revisão bibliográfica
Após analise preliminar é necessário reunir e verificar, o que já se sabe sobre o assunto, ou seja, as informações sobre o determinado tema. Varias razões podem ser apontadas à esta necessidade:
i) Conhecimento do estado de conhecimento no domínio que selecionamos, por exemplo se o problema que se coloca já foi inclusive solucionado ou o que poderá estar a faltar para isso;
ii) Importância em se conhecer as teorias existentes na área do estudo a realizar, por exemplo quais  as teorias explicativas do fenômeno em questão de modo a melhor se poder equacionar o próprio modelo de análise a seguir;
iii) Conhecimento da metodologia de investigação mais frequentemente usada no problema em causa (procedimento, amostra, plano, instrumentos); e,
iv) Conhecimento das questões deixadas em aberto por outros investigadores, nomeadamente os erros metodológicos mais frequentes ou reducionismos em que incorreram os estudos anteriores.
É importante ressaltar que esta revisão bibliográfica é importante para se definir e melhor enquadrar o referencial teórico para a investigação selecionada. Serve também para a obtenção de indicações e sugestões importantes tendo em vista a definição do procedimento metodológico, sobretudo, quando se trata de definir o plano da investigação ou de precisar as amostras e os instrumentos a serem utilizados na coleta dos dados, assumindo o papel de interface entre a delimitação do problema e a formulação da hipótese, bem como dos passos seguintes na investigação.
Existem diversas “bases de dados” disponíveis e algumas publicações fazem a revisão e sistematizam os livros e as revistas que vão sendo publicadas. É preponderante que o investigador de uma determinada área, consulte os artigos publicados desta mesma área , particularmente daqueles que ciclicamente fazem uma síntese das principais investigações no domínio, pois nos levam rapidamente a outras referencias que merecerão ser consultados.

Hipóteses
Entende-se como a explicação ou solução mais plausível de um problema, sendo que a “hipótese é uma proposição testável, que pode vir a ser a solução do problema” (McGuigan, 1976 citado por Almeida & Freire, 2003).
A formulação das hipóteses deve obedecer a alguns princípios de modo a reunir algumas características, devem ser testáveis, todavia devem enquadrar-se nas hipóteses existentes na mesma área, serem justificáveis, relevantes, que a sua formulação obedeça a princípios de clareza logica e de parcimônia e ainda devem ser suscetíveis de quantificação e reunirem alguma generalidade explicativa (McGuigan, 1976 citado por Almeida & Freire, 2003).
           
Classificação das hipóteses
As hipoteses podem classificada-se de forma diversa, de acrdo com o processo como são formuladas e com o nível da sua concretização. Quanto ao processo da sua formulação, podem ser:


As hipóteses podem dividir-se, ainda, segundo o nível de concretização em que nos possamos situar. Assim são ditas:

           
As hipóteses estatísticas apresentam-se de duas formas: hipótese nula (H0) e alternativa (H1), sendo: i) sob a forma de uma implicação condicional “se...então” ou “se...e se...então” (exemplo de hipótese dedutivo-experimental); e ii) sob a forma de uma proposição relacional “as pessoas que...apresentam também...” (exemplo de hipótese indutivo-correlacional). Na hipótese nula, postula que os dados provenientes de diferentes condições ou grupos não se diferenciam, não se associam ou não se correlacionam significativamente do ponto de vista estatístico, por outro lado a hipótese alternativa é uma outra explicação alternativa para o fenômeno. A recusa de uma hipótese nula não significa, de imediato, a verificação da hipótese experimental. Segue uma síntese para uma sistematização na classificação das hipóteses:
         


A investigação dirigida por uma hipótese experimental apenas se pode concluir quando conseguimos excluir essas explicações alternativas para um determinado fenômeno. Todavia não podemos esquecer que uma hipótese decorre, ou deve sempre decorrer, de uma teoria e que esta tenta ler, descrever e explicar uma realidade.
Na formulação das hipóteses interessa cuidar da forma final do próprio texto (formulação). Alguns cuidados podem ser sugeridos como norma a respeitar:

            
Aceitação e rejeição das hipóteses
Trata-se de confirmar ou anular, a partir de uma certa margem de probabilidade de certeza, a aceitabilidade de uma hipótese nula fixada. A probabilidade de aceitar a hipótese nula sendo falsa designa-se, habitualmente, por erro de tipo II. A situação inversa também ocorre, ou seja, rejeitar a hipótese nula sendo esta verdadeira (erro do tipo I). Como os dois tipos de erros têm uma relação inversa entre si, podemos aumentar um ao tentarmos diminuir o outro.
Outro aspecto a definir prende-se com o sentido esperado dos valores calculados. Podendo ser i) unidirecional ou unilateral; ii) bidirecional ou bilateral. O calculo da probabilidade estatística de um coeficiente difere num e noutro caso, recorrendo-se a um teste unicaudal (one-tail test) e bicaudal (two-tail test), respectivamente.


Variáveis
Ao formular as hipóteses o investigador está, a identificar as variáveis e a definir as suas relações, ou seja o respectivo papel na investigação. Dois sentidos são frequentemente aplicados e estão diretamente associados aos dois modelos tradicionais de investigação na Psicologia e na Educação: o experimental (a variável identifica-se com o fator determinante ou interveniente, onde a preocupação esta nas variáveis de ocorrência de um comportamento (meio, organismo, condições) e na sua capacidade explicativa do mesmo comportamento) e o correlacional (mais descritiva que explicativa, a variável tem sobretudo a ver com as dimensões do comportamento avaliadas ou com os construtos (entidades abstratas ou as dimensões latentes do comportamento) subjacentes (traço ou traços a avaliar) e o objetivo esta sobretudo em quantificar e relacionar as dimensões psicológicas).
Segundo Bravo (1995), a passagem do construto à variável designa-se, frequentemente, por processo de operacionalização das dimensões subjacentes aos comportamentos em estudo, incluindo as seguintes fases:

            
           Estatuto das variáveis na investigação
Em função do papel que uma variável tem numa investigação ela pode ser designada como variável independente, experimental ou de tratamento (identifica-se com a dimensão ou a característica que o investigador manipula (ativa) deliberadamente para conhecer o seu impacto numa outra variável (dependente)) ou como variável dependende ou critério (define-se como a característica que aparece ou muda quando o investigador aplica, suprime ou modifica a variável independente).
Podem ainda existir outras variáveis ditas intervenientes, moderadoras ou intermedias (pela sua condição de mediação).
Por ultimo, nos estudos experimentais algumas variáveis influenciam associadas à variável independente e, embora alheias ao estudo em causa, afetamos resultados da variável dependente, contaminando-os, são as chamadas variáveis estranhas ou parasitas.
Segundo McGuigan, 1976 citado por Almeida & Freire, (2003), em  qualquer estudo experimental procura-se controlar o efeito das variáveis através de procedimentos precisos. Segue abaixo:
                                      
           No proximo quadro procura-se sistematizar a informação apresentada a proposito da tipologia             de variaveis que podemos encontrar e considerar na investigação psico-educacional.

                      
Ligado ao estatuto das variáveis na investigação, podemos ainda classificar as variáveis, especificamente na analise do comportamento, sobretudo a partir das correntes behavioristas de observação, o comportamento passou a ser analisado no quadro de um sistema dinâmico e para o qual convergem diversas variáveis: o sistema “EORC” (Gonçalves, 1990, citado por Almeida & Freire, 2003).
E (estimulo) – variáveis ambientais ou outras imediatas (anteriores) à resposta (R) e que a desencadeiam.
O (organismo) – conjunto de variáveis pessoais, não apenas orgânicas mas também da historia e do desenvolvimento pessoal.
R (resposta) – a conduta ou resposta, a componente motora (atividade) do comportamento.
C (consequências) – todos os estímulos contingentes à resposta, concomitantes ou seguidos no tempo.

Parâmetros de medida das variáveis
Para a verificação e mensurabilidade de uma característica ou comportamento podemos considerar vários parâmetros. Tais parâmetros podem ser tomados em separado ou em simultâneo, e os mais frequentes são os seguintes:
                   
           
            Natureza da medida das variáveis
Sobre este aspecto, reportamo-nos à sua natureza e à apreciação quantitativa das suas manifestações, ou a forma como vão ser medidas.
            As variáveis em Psicologia, podem dividir-se em:

                       
As variáveis qualitativas, também designadas tipológicas (descrevem tipos ou classes) podem subdividir-se em variáveis dicotômicas/descontinuas (apenas duas categorias) ou politômicas (três ou mais categorias).
 
            
Ao nivel das variaveis quantitativas, estas podem subdividir-se em discretas (apenas podem tomar valores inteiros) e continuas (podem tomar qualquer valor inteiro ou fracionario dentro de um continuum (Guiselli et al, 1981, p.13 citado por Almeida & Freire, 2003).

            
Escala de medida das variáveis
As escalas de medida, podem distribuir-se por escalas nominais (meramente classificativas, permitindo descrever as variáveis ou designar os sujeitos, mas sem recurso à quantificação), ordinais (os indivíduos ou as observações distribuem-se já segundo uma certa ordem, que pode ser crescente ou decrescente e, nesse sentido, permitem já estabelecer diferenciações), intervalares (são muito utilizadas na investigação psico-educacional e, salvo raras exceções, são as de mais elevado nível de quantificação que conseguimos na investigação em Psicologia e na Educação) e proporcionais ou de razão (em acrescento às escalas intervalares, podemos dispor já de um verdadeiro ponto zero (zero absoluto)). A questão dos níveis de medida, ou o salto entre escalas mais qualitativas para escalas quantitativas, passa evidentemente pelas dificuldades da medida nas Ciencias Sociais e Humanas ou pela própria mensurabilidade das variáveis. Tais dificuldades estão ligadas:

                     

Seguem as principais características das quatro escalas descritas e as respectivas implicações em termos das análises estatísticas disponíveis:
           
As variáveis no quadro dos modelos de investigação
O paradigma experimental de investigação aparece frequentemente assumido como forma de se avaliar o grau de “ciência” de um determinado conhecimento ou disciplina.
Em primeiro lugar, podemos apontar as dificuldades na definição e delimitação das variáveis a considerar, em segundo lugar, colocam-se varias reservas à medida e quantificação em Psicologia e Educação, ou seja um dos pontos importantes do método experimental e finalmente podemos questionar a precisão da medida face ao caráter não direto da avaliação, à inexistência de “zeros reais” e aos instrumentos usados.

Referências:

Almeida & Freire. (2003). Metodologia da Investigação em Psicologia e Educação, Edição da Psiquilíbrios, Braga p. 35-71.

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